Decisões definitivas na vida
D. Carlos Lema Garcia
Para falar de vocação, conto a história que ouvi daquele rapaz que pensava seriamente em ser sacerdote, porém tinha um medo enorme de decidir e de falar a seus pais que desejava ingressar no seminário. Tinha muitas dúvidas e foi falar com um sacerdote amigo, que o animou a fazer os encontros vocacionais para se incorporar ao seminário. O rapaz, contudo, continuava com muitas dúvidas. Então, resolveu pedir um sinal de Deus. O Padre não concordou: “Você não pode colocar condições a Deus, não pode forçar Deus a lhe dar um sinal da sua vocação”. Mesmo assim, ele pediu a Deus: “Se eu devo ser sacerdote, que caia um apito em minha mão!”
O rapaz ficou com grande receio de haver desobedecido ao Sacerdote, pensando: “Será que Deus vai me castigar?” Dias depois, ele estava com um grupo de amigos no colégio e seus colegas resolveram jogar futebol.
– Você quer jogar?
– Não, porque não tenho roupa adequada e esse tênis não é bom para jogar.
– Então, você apita o jogo.
Assim, deixaram-lhe um apito na mão…
Hoje, fala-se muito de vocação, da necessidade que a Igreja tem de se renovar com jovens dispostos a se comprometer com Deus. No entanto, poderíamos fazer uma constatação surpreendente: há comunidades, seminários e instituições da Igreja que conseguem um bom número de vocações e outras estão enfrentando uma séria dificuldade em encontrá-las.
Diante disso, parece acertado lembrar que “vocação” significa “chamado” e, portanto, trata-se de uma iniciativa divina: é Deus quem chama a pessoa para segui-Lo em um caminho vocacional. E Deus continua a chamar muitas pessoas: na verdade, há muitíssimas pessoas que têm vocação e ainda não tomaram consciência deste chamado, seja por falta de oração, seja por falta de acompanhamento, seja por falta de alguém que as ajude a discernir seu caminho.
A vocação divina difere da definição de uma profissão, porque, neste caso, a pessoa escolhe uma carreira de acordo com suas aptidões pessoais: aquele que deseja ser engenheiro deve gostar de Matemática; quem decide seguir uma profissão na área da saúde não deve ter medo de ver sangue etc. No caso da vocação sobrenatural, Deus é quem entra nas nossas vidas e nos coloca diante de um caminho de compromisso com Ele, que exige uma resposta definitiva.
São João Paulo II foi o primeiro papa a conceder uma longa entrevista a um jornalista francês chamado André Frossard. Em determinado momento, falou sobre a sua eleição como Papa: “Penso que, naquele dia, o voto do conclave surpreendeu a muitos outros tanto quanto a mim. Diante daquilo que Deus nos manda, que parece humanamente impossível, no entanto comprovamos como Ele nos dá os meios de realizá-lo. É o segredo de toda vocação. Toda vocação muda os nossos projetos… abre outro diante de nós. E é maravilhoso ver até que ponto Deus nos ajuda interiormente, socorre-nos e nos prepara para entrarmos neste novo projeto e considerá-lo nosso, vendo nele muito simplesmente a vontade do Pai. E a aceitá-lo, sejam quais forem a nossa fraqueza e o nosso apego às opiniões pessoais”.
O Papa Francisco alertou os jovens durante a JMJ do Rio de Janeiro: “Deus chama para escolhas definitivas, Ele tem um projeto para cada um: descobri-lo, responder à própria vocação significa caminhar na direção da realização jubilosa de si mesmo. A todos, Deus nos chama à santidade, a viver a sua vida, mas tem um caminho para cada um”.
Quais seriam os sinais fundamentais de um chamado a uma vida de total entrega a Deus. Vejamos brevemente a vocação de Nossa Mãe, Santa Maria:
- Ter condições e não ter impedimentos: O Arcanjo São Gabriel, ao anunciar a vocação de Maria, começa saudando-a dessa forma: “Ave, cheia de graça, o Senhor é contigo!” (Lc 1,28).
- Ter consciência da grandeza de um chamado divino e sentir medo. Maria perturbou-se com a saudação inicial e o Arcanjo a anima: “Não temas, Maria, porque encontraste graça diante de Deus!” (Lc 1,30).
- Decidir-se a dizer sim a Deus e colocar toda a vida em suas mãos: “Faça-se em mim segundo a tua Palavra” (Lc 1,38).
Uma coisa é certa: Deus não chama sem conceder as condições necessárias. Portanto, é preciso examinar-se na oração e pedir a ajuda do diretor espiritual para verificar se a falta de condições ou de aptidões mostra que não se tem essa vocação. Ao contrário, se se tem as condições e não há impedimentos, a probabilidade de haver uma clara vocação divina é maior. Por isso, o fato de uma pessoa considerar seriamente a possibilidade de ser chamada a um determinado caminho de entrega a Deus já indica que é bastante provável que esse seja o seu caminho. Um motivo que conforta e anima a corresponder à vocação é considerar que quando Deus dá a uma pessoa a luz da vocação, também lhe dá a graça necessária para corresponder e para decidir com generosidade.
Pedimos a Jesus, Senhor da messe, que envie operários para a sua colheita.