Fica conosco, Senhor!
D. Carlos Lema Garcia
Na tarde do Domingo da Páscoa, dois discípulos de Jesus regressam à sua aldeia, Emaús, profundamente desanimados porque Jesus Cristo, em quem haviam posto todo o sentido das suas vidas, tinha sido entregue nas mãos dos líderes religiosos e do governador, condenado à morte e sepultado havia três dias. Eles provavelmente eram do grupo dos 72 discípulos. Nos últimos anos haviam presenciado tantas coisas grandes: até eles mesmos haviam pregado o Evangelho, presenciado algum milagre…
Como estava a sua alma? Eles tinham deixado muitas coisas boas para seguir Cristo. Sua única ambição era acompanhá-lo, ouvi-lo, aprender dele, ajudá-lo em tudo. O futuro parecia-lhes promissor: conheciam o poder e a sabedoria do seu Mestre. Comprovavam que seu prestígio conquistava muitas pessoas.
Mas agora, em poucas horas, tudo ficou completamente arruinado: o Mestre traído, entregue nas mãos dos judeus, foi condenado à morte pelo governador romano. Seu corpo, depositado no sepulcro, foi tirado de lá e não se sabe o que foi feito dele, apesar de algumas mulheres disserem ter visto um anjo assegurar que Ele está vivo. Tudo parece haver terminado tragicamente. E, agora, o que será de nós? O que faremos?
Um forasteiro os encontra no mesmo caminho e começam a conversar. No entanto, eles não percebem que o viajante era o próprio Senhor ressuscitado. O diálogo quase completo é transcrito pelo evangelista: manifestam seu estado de ânimo, abrem seu coração e relatam a sua decepção. Trata-se de uma conversa que abranda o medo, recupera o ânimo, alivia seus corações, ilustra sua inteligência e os transforma completamente.
É interessante a postura de Jesus, ao deixar-lhes completamente livres para contar tudo que lhes pesa no coração. E não os interrompeu, abreviando o desabafo. Esperou que exteriorizassem seus sentimentos, manifestassem seus medos, desesperanças e frustração. Jesus provocou o encontro, coincidindo no mesmo caminho; participou da conversa, intuiu seus sentimentos pelo modo cabisbaixo com que caminhavam e percebeu seu coração tristonho. Com palavras cálidas, ajudou a vencer a ignorância, o desânimo, a deformação do juízo daqueles homens, que sentiram confiança para contar o que lhes preocupava: os acontecimentos ocorridos em Jerusalém na tarde da sexta-feira, culminando na morte de Jesus de Nazaré. Com muita paciência, apoiado nas Escrituras, apresentou uma série de argumentos para mostrar como o plano de Deus foi-se cumprindo, afirmando que não tinham motivo para andar angustiados: …”começando por Moisés, e passando por todos os profetas, explicou-lhes, em todas as Escrituras, o que se referia a ele. (At 24, 25)
Ao chegarem à sua aldeia, eles o detiveram, como se dissessem: “Precisamos continuar conversando com você. Sentimos o nosso coração aliviado. Recuperamos a alegria. Foi muito bom abrir a alma com sinceridade total e confidenciar os nossos sentimentos…”.
Nesse momento, Jesus se revelou ao sentar-se à mesa com eles e ao partir o pão eucarístico; imediatamente, desapareceu de sua vista. Eles se sentem agora felizes e alegres. Estão completamente recuperados. “Levantaram-se na mesma hora e voltaram a Jerusalém… e contaram o que lhes havia acontecido no caminho o como o tinham reconhecido ao partir o pão” (Lc 24, 35).
Nesse tempo da Páscoa, devemos fazer o mesmo: conversar em nossa oração com Jesus Ressuscitado, contar-lhe a nossa situação: nossas preocupações, aflições e desânimos. Detê-lo entre nós – “fica conosco” – na Eucaristia, na Comunhão, na fração do pão. Somos privilegiados porque temos o nosso Deus tão próximo: nos nossos caminhos diários, na celebração da Missa e na Sagrada Comunhão. Que saibamos encontrar Jesus Ressuscitado na oração e na Eucaristia.